A desigualdade social é ruim para você

Manuela Cota
4 min readOct 27, 2021

Não te conheço, então prefiro não começar assumindo nada. Mas todos nós sabemos que muitas pessoas com uma qualidade de vida melhor no Brasil acham que sua vida vai piorar se reduzirmos a desigualdade social no Brasil e isso, colega, está longe de ser verdade.

Entenda também que eu não quero dizer que essas pessoas são ruins, muito pelo contrário. O Brasil tem se tornado cada vez mais um país solidário e muitas dessas pessoas são impelidas a ajudar por um espírito cristão, ou mesmo por pena. Apesar de vermos com uma frequência maior do que a desejada o discurso “empregada doméstica indo pra Disney, uma festa danada”, o brasileiro, no geral, não deseja o mal e o sofrimento do outro.

A questão aqui é outra: nós precisamos entender que a nossa vida, por mais privilegiada que ela seja, é sim muito pior por viver em um país com tanta desigualdade. E precisamos agir para reduzir desigualdades,tornando a nossa vida melhor também.

Precisamos fazer algo a respeito. Photo by Clay Banks on Unsplash

Sim, eu estou adicionando um motivo egoísta para você querer combater a desigualdade social e não tem nada demais nisso. Devemos lutar pela redução das desigualdades pelos outros e também por nós. Ainda não foi convencido?

Porque a desigualdade social é ruim para você

Podemos começar a analisando questões mais óbvias, como a violência e a insegurança, que tendem a aumentar pela falta de oportunidades. Ou falar da pobreza e da desnutrição de crianças em idade escolar. Mas os prejuízos vão muito além disso e o problema não é só a pobreza.

Para garantir que estamos falando de problemas relacionados à desigualdade, e não à pobreza, vou trazer informações de pesquisas realizadas em países desenvolvidos, que já têm economias fortes e índices menores de pobreza, mas ainda são consideravelmente desiguais. Conheci essa realidade em uma aula que tive recentemente com a Professora Kate Pickett, da Universidade de York, uma epidemiologista brilhante que todo mundo deveria ouvir uma vez na vida. Deixo aqui um vídeo de uma palestra para quem se interessar.

Photo by Mathias P.R. Reding on Unsplash

Pesquisas nessas nações desenvolvidas, então, permitiram comparar variáveis com o nível de desigualdade de cada país, medido pelo índice de Gini, e fazer correlações claras entre a desigualdade e os seguintes prejuízos:

  • maior prevalência de doenças mentais;
  • menor bem-estar infantil;
  • menos mobilidade social;
  • maiores taxas de homicídio;
  • maiores frequências de depressão e isolamento social;
  • maior chance de desenvolver ansiedade relacionada a status ou ao valor próprio;
  • maior incidência de doenças relacionadas ao estresse crônico;
  • maiores níveis de vícios como alcoolismo e apostas em jogos;
  • menores níveis de confiança (entre cidadãos e nas instituições).

É importante ressaltar que esses problemas afetam também aqueles mais favorecidos na escala social, ainda que tenham mais renda e possibilidades que os demais.

Além disso, uma das coisas mais curiosas que faz a desigualdade social ser ruim para todos é o fato de que, em sociedades mais desiguais, as pessoas têm mais tendência de se autopromover e aumentar o seu valor e importância. Ou seja, a desigualdade social nos faz mais narcisistas.

A desigualdade social é ruim para o planeta também

Outro aspecto negativo abordado pela Prof. Kate Pickett em seus estudos e livros está relacionado com o meio ambiente. Não é novidade que países mais ricos tem maiores níveis de emissão de carbono e de consumo de energia e água, mas o que as pesquisas mostram é que, entre os países desenvolvidos, aqueles que são mais desiguais geram ainda mais impacto ambiental negativo.

Photo by Maxim Tolchinskiy on Unsplash

Ou seja, a desigualdade contribui para maiores taxas de poluição e consumo de matéria prima, além para reduzir os níveis de reciclagem de resíduos. Uma das explicações para esse fenômeno é que, como explicado anteriormente, a desigualdade provoca um comportamento mais individualista. Assim, a sociedade se torna mais consumista, menos preocupada com o impacto que as suas escolhas tem para os outros e mais desconfiada.

Todos esses comportamentos dificultam a luta contra a mudança climática, para além de poluir.

Nem tudo está perdido

Espero que, por agora, você já tenha entendido que a desigualdade é ruim para todo mundo. Países mais igualitários se saíram melhor na luta contra o coronavírus, permitem que seus habitantes tenham vidas menos estressantes e promovem maiores níveis de confiança entre a população.

Então, nos resta trabalhar por uma alta qualidade de vida, que promova a prosperidade e seja sustentável e equitativamente compartilhada. Parece impossível e muitos dizem que, realmente, não tem como conciliar desenvolvimento econômico e sustentabilidade, mas não é isso que mostram estudos e experiências recentes. Iniciativas de investimento como Bridges na Inglaterra, Yunus no Brasil e na Alemanha e o trabalho da Natura na Amazônia, provam o contrário.

Mesmo se você não é o Bill Gates e não tem bilhões de dólares a sua disposição para investir em tecnologias e negócios que promovam a redução da desigualdade social, você pode contribuir. Ao participar mais ativamente da política e cobrar medidas que reduzam desigualdades, ao invés de ampliá-las, voluntariar-se em projetos que promovam a autonomia de pessoas vulneráveis e escolher consumir marcas que geram ativamente um impacto positivo no país, você já está começando um movimento que pode fazer a diferença.

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Manuela Cota

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